terça-feira, 1 de junho de 2010

Carandiru

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Filme brasileiro de 2003 baseado em fatos reais. Esses fatos foram publicados em um livro chamado Estação Carandiru de Dráuzio Varela. No Grande Prêmio Brasil levou o “melhor roteiro adaptado” e “melhor diretor” que é o Hector Babenco, que possui certa fama internacional.

“Já falei, não tem ninguém me esperando lá fora. Não tenho pressa para sair.”

Carandiru é o nome do bairro onde fica a Casa de Detenção de São Paulo. Poucos sabem que na década de 20, essa prisão foi considerada como uma das melhores do mundo (na qual havia até mesmo aulas para os detentos). Era a maior cadeia da América Latina, cabendo até quatro mil detentos. O filme a retrata nos anos 90, com até oito mil detentos espremidos em uma cadeia considerada como uma das mais desumanas do mundo. Dráuzio Varela entrou na prisão como o médico responsável por informar e amenizar a pré-epidemia de AIDS que começava a ser gerada dentro da prisão.

“Eles são os donos da cadeia, doutor. Isso aqui só não explode porque eles não querem.”

Em meio a superlotação e abandono completo do conforto e higiene, os detentos passam a comandar internamente a cadeia obtendo até um acordo com as autoridades da cadeia. Nesse acordo, as autoridades não interfeririam na vida dos detentos desde que eles não criassem um problema no exterior. Pouco faltava para que acontecesse uma tragédia. Então fazia parte da vida diária do presidiário a violência extrema, comércio de drogas (e outras coisas), falta de policiamento e níveis epidêmicos de falta de saúde.

“Sem chance.”

Num ambiente desses, logicamente não há uma reforma educacional. Os estupradores são parte da pior estipe, poucos vivem. Há um setor que serve exatamente para os detentos que tem medo de morrer. Nesse setor, superlotado, não há sol. Isso conclui que os detentos preferem viver em condições subumanas para evitar a morte certa. Os detentos se mostram muito sinceros, falando de seus crimes sem arrependimento. O médico se mostra sempre neutro e sorridente. E as autoridades se mostram consoladas. Tudo vive numa perfeita harmonia. Esse é o problema do filme. O conflito só se mostrou no momento da rebelião, sendo que essa não era a realidade. Por ser um filme feito sob a visão dos detentos (com um espetacular manejo de flashbacks que mostram as vidas dos detentos antes de entrarem no Carandiru), os crimes são sempre justificados, mas isso não explica a falta de humanidade gerada nas pessoas. Homossexualismo é cômico, as drogas são permitidas (seguindo aquela linha de pensamento que o consumo de drogas é conseqüência, então deve haver uma reforma para que não se droguem; mas como não há essa reforma, fica tudo parado) e a polícia é implacável, com um caráter quase psicótico (frio e agressivo).

“Culpa tem remédio, doutor?”

É interessante ver outros aspectos da vida dos detentos. O sofrimento dos familiares se mostra tão grande quanto a agonia dos que estão dentro da cadeia. Pessoas jovens, bonitas, cultas e tranqüilas também são capazes de cometer crimes e não são poupados dentro da cadeia. Entre os próprios detentos, há uma falta de piedade e mostra a paranóia que a droga é capaz de gerar. A religião se mostra sempre presente, mas ao mesmo tempo, é algo morto, que não é capaz de salvar ou, ao menos, interfere na vida dos detentos. No final das contas, os presos são visto como verdadeiras caricaturas da sociedade brasileira (tão diversificada quanto ela é). Inclusive, é perceptível uso de grande quantidade de estrelas cinematográficas brasileiras (entre eles estão: Wagner Moura, Rita Cadilac, Rodrigo Santoro, Caio Blat, Lázaro Ramos, etc.).

“Havia duas escolhas: esquecer ou voltar.”

Não há uma real vontade de sair da cadeia, sendo que muitos preferem permanecer por lá. Possuindo o controle absoluto do local onde vivem podem cozinhar, ver TV e até se drogar em suas celas (cobrando aluguel para dormir lá, é claro). A rebelião aconteceu no dia 2 de outubro de 1992. Apesar de muitos acharem que o filme mostra q a rebelião aconteceu por causa de uma cueca pendurada no varal, não é isso que realmente mostra. O estopim é gerado quando a tensão entre os detentos se torna insuportável, tanto que nem uma cueca em um varal diferente pode ser tolerada. Sabendo que já há uma falta de condições humanas para se viver lá, os prisioneiros se uniram contra as autoridades, gritando e aclamando ao mundo por uma ajuda. Com a mesma falta de tolerância que houve entre eles, a policia civil entra na casa de detenção e mata por volta de 111 detentos, mesmo com eles terem se desfeito de muitas armas (sendo a maioria delas apenas armas brancas). O horror gerado foi tão grande que o fato rodou o mundo inteiro e a opinião pública se tornou insustentável, levando à única solução possível: a demolição da cadeia (que ocorreu em 2002).

“O senhor quer ouvir outra mentira? Aqui ninguém é culpado. O senhor não percebeu isso?”

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