sábado, 30 de outubro de 2010

Paris, te amo

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Paris, je t’aime

Criado em 2006 como o primeiro filme do Projeto Cities of Love (Cidades do amor), é, na verdade, uma coletânea de curtas independentes com cerca de cinco minutos cada. Todos são feitos por um diretor específico conhecido mundialmente. Têm como objetivo retratar o amor em Paris, sendo que esse amor pode ser maternal, fraternal, entre homem e mulher, entre dois homens, entre alguém e a cidade, etc.

“Cada esquina tem uma história para contar.”

Abaixo, temos todos os curtas em ordem que foram apresentados no filme:

1) Montparnasse de Bruno Padalydes – um homem frustrado pela falta de amor na sua vida se apaixona por uma mulher que desmaia no estacionamento em que ele estava. É o amor a primeira vista.

2) Quais de Seine de Gurinder Chadha – Dois garotos jovens ficam paquerando e incomodando as mulheres que passam na rua enquanto um olha apaixonadamente para uma garota muçulmana. Depois de ajudá-la, encontra com ela na Mesquita e ficam juntos (sob aprovação do pai, é claro). O respeito gera amor.

3) Le Marais de Gus Van Sant – Numa galeria de artes, um garoto filosofa sobre a vida e se declara pra um ajudante da galeria, que permanecia calado. No final, ele lhe entrega o telefone. Depois que vai embora, o ajudante revela que não fala a língua do garoto e não havia entendido nada. O amor acontece, mas não vence a barreira da língua sempre. Infelizmente.

4) Tuileries de Joel & Ethan Coen – No metrô, um turista quarentão lê num guia de viagens que não se deve encarar as pessoas na rua. Sem querer, ele encara um casal jovem do outro lado da estação. O rapaz fica com raiva, briga com a garota dele, que fica com raiva também. Num ato impensado, ela vai até o lado do turista e o beija. O rapaz fica enlouquecido e desce socos e chutes nele. No final, o casal sai bem e mais apaixonado e o turista se vê no chão, todo machucado. É, o amor jovem é louco.

5) Loin Du 16ª de Walter Salles & Daniela Thomas – Uma jovem garota deixa seu bebe de colo na creche e passa um bom tempo no transito até chegar à casal na qual trabalha como babá. E cuida do bebê da sua chefa, cantando a mesma canção de ninar que canta pro seu filho. O amor pode ser irônico e cruel, às vezes.

6) Porte de Choisy de Christopher Doyle – Na ruas de uma Paris irreal, um vendedor de produtos de beleza é mal recebido por uma ex-lutadora oriental que agora era dona de salão de beleza. Após comprovar a qualidade do produto, todas começam a tratá-lo bem e seduzirem ele. O marketing como responsável pelo amor.

7) Bastille de Isabel Coixet – Um homem decide se separar de sua mulher em um restaurante para viver com sua amante. Antes, ela conta que está com leucemia avançada. Ele desiste da separação, se desfaz da amante e cuida dela com todo o amor possível. De tanto fingir que a ama, cuidando dela, passa a amá-la de verdade. Até ela morrer. E ele nunca supera a morte dela. O amor nem sempre é justo.

8) Place des Victories de Nobuhiro Suwa – mãe ainda transtornada pela morte do filho (enquanto o resto da família já superou), vê o cowboy, que o filho tanto gostava, na rua. Lá, ele lhe dá a oportunidade de ver seu filho novamente. Ela o sente, e percebe que é hora dele ir embora pra sempre. O amor materno é único, e imortal.

9) Torre Eiffel de Sylvain Chomet – molequinho conta como seus pais se conheceram: eles eram mímicos e ignorados por todos. Apesar de toda melancolia marcada em seus rostos, sempre tentavam chamar atenção. Até que um dia, incomodaram tanto que foram presos. Dentro da cadeia, eles se conhecem. Para amar, precisa ter humor.

10) Parc Monceau de Alfonso Cuaron – Mostra o dilema da mãe em deixar o filho pela primeira vez, para ir ao cinema com uma amiga. E ela confia no pai dela (que faz de tudo para tranquilizá-la) para cuidar do bebê. O amor que passa por gerações.

11) Quartier des enfants rouges de Olivier Assayas – Um traficante, ao levar cocaína para uma atriz americana, se apaixona por ela e ela não percebe. Depois, ela sente “falta” dele e pede coca novamente, como um pretexto para vê-lo novamente. Só que outro vai e entrega a droga à ela (e a rouba). O amor nem sempre acontece.

12) Place des Fetes de Oliver Schmitz– Um rapaz negro paquera a enfermeira que o ajuda. Ele a havia visto uma vez enquanto limpava um estacionamento. Nesse tempo, ele foi demitido e alguns jovens roubaram as coisas dele e, por reagir, acaba levando uma facada. Ele morre nos braços dela. O amor, algumas vezes, não tem tempo para acontecer.

13) Pigale de Richard Lagraveneze – um velho abastado vai para uma boate erótica. Lá ele encontra uma senhora de idade que o paquera. Depois, percebe-se que eles já se conhecem e que são um casal entediado realizando uma fantasia sexual (sexo anônimo) para reativar o fogo. Não dá certo e eles brigam. E depois se entendem. O amor vai muito além de fantasias sexuais.

14) Quartier de La Madeleine de Vincenzo Natali – Nas ruas de uma Paris irreal, um jovem vê uma bela vampira sugando sangue de uma pessoa já morta. Ao encará-la, vê amor em seus olhos (e vice-versa). Ela resolve ir embora e deixá-lo em paz. Ele a quer e se corta pra que saia sangue e ela fique com ele. Ela vai embora mesmo assim. O corte foi mais profundo do que ele esperava e começa a morrer. Ela suga o sangue dele e o transforma em vampiro. O amor ao extremo pode trazer resultados mais extremos.

15) Pire-Lachaise de Wes Craven – No cemitério, um casal em “lua de mel” (não se casaram ainda) passeia entre os túmulos, até encontrarem o de Oscar Wilde. Passam a discutir a relação e a garota percebe que falta sorriso na vida dele, desistindo do casamento. Irrealmente, o rapaz vê Oscar Wilde lhe dizendo para correr atrás dela e aprender a sorrir. E ele o faz. Algumas vezes, para amar basta apenas sorrir.

16) Faubourg Saint-Denis de Tom Tykwer – Um garoto passa a refletir todo o processo de namoro que tem com uma atriz Londrina depois de receber um telefonema dela terminando tudo. Percebe que a ama acima de tudo. E sabe que a ligação era apenas mais um treinamento para uma peça que ela estava trabalhando. O amor prega peças e dá muitos sustos.

17) Quartier Latin de Frederic Auburtin & Gerard Depardieu – Um ex-casal idoso se encontra num restaurante e começam a falar de seus atuais parceiros sem discrição e com muita diversão. Algumas vezes, não é preciso viver junto para amar plenamente.

18) 14º Arrondissement de Alexander Payne – Uma turista, já em idade avançada, junta todo dinheiro que pode para passar uma semana em Paris (depois de ter passado a vida aprendendo a falar francês). Se sente solitária, mas feliz. Descobre que se apaixonou pela cidade. E que Paris se apaixonou por ela.

No final, algumas histórias se encontram. Outras não. Mas todas terminam bem de alguma maneira. E sempre apaixonados.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Império dos Sentidos

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Filme japonês criado em 1976. Conta uma história real de um casal que vivia em Tóquio no ano de 1936, em pleno conflito entre o ocidente e o oriente. Levou o Hochi Film Awards de “melhor ator” e iniciou o estilo de filmes com sexo explícito, mas não pornográficos (por não ter o sexo em si como tema central).

“Eu me sinto renascida.”

Abe Sada é uma ex-prostituta que fugiu de sua terra para esquecer o seu passado de luxúria e trabalhar na casa do senhor Kichizo. Desde o começo do filme, é possível perceber o apetite sexual que envolve o mundo de Sada. Quando ela sai na rua, encontra um velho que já havia sido seu cliente no passado. Ela não se recorda dele, mas ele se lembra dela e quer mais uma noite. Apesar de mostrar o membro dele explicitamente, não há uma beleza sexual. Pelo contrário, há uma repulsa do sexo. Tanto que ele não dá conta de iniciar o sexo com ela.

Toda manhã, Sada via Kichizo e a esposa transando e passa sentir uma atração por ele. Já o senhorio, percebe uma química entre ele e Sada e investe em paqueras (sempre consciente de que ela já havia sido uma prostituta) até que eles se transformam em amantes. A casa de Kichizo sempre foi vista como respeitável, mas percebe-se que era tudo fachada. O sexo é selvagem e a traição é sempre clara.

Um ponto interessante do filme é ver o papel das gueixas na casa dos senhorios. Elas não são prostitutas, como dizem os ocidentais. São artistas da mais alta estirpe e muito talentosas. São vistas com respeito e confiáveis para a família. Não se espera que haja uma relação sexual entre elas e seus clientes. Tanto que muitas passam a não freqüentar a casa de Kichizo, quando o affair dele com Sada se torna explícito. Inclusive, Sada é todo oposto daquela tradição oriental. Na verdade, ela é uma ocidental levada aos extremos, tudo que importa para ela é ter novas experiências. Conhecer tudo. Consumir o máximo que puder (de paixão e sexo).

“Quero sentir seu prazer.”

No momento em que os amantes transam pela primeira vez tudo começa a girar em torno do sexo. Vão para uma casa e ficam sozinhos o tempo todo. Deixam de comer e beber. Recusam-se a limpar ou deixar que alguém limpe o quarto impregnado com o cheiro de sexo. E a mais declarada nessa paixão é Sada, que não deixa Kichizo nem ir ao banheiro e começa a falar de dor e morte o tempo todo. É como se o extremo do prazer fosse a dor. E o extremo da dor era a morte. Inicia-se assim jogos sexuais que incluem voyeurismo, masturbação, ménage, orgia, sadomasoquismo e brincadeiras até com menstruação, bebidas e comida. Inclusive, houve uma cena com o ovo (que foi introduzido em Sada por Kichizo), que se tornou muito polêmica, por mostrar o sexo da mulher com clareza e a tratar como um animal (tanto que, para tirar o ovo, ela “choca” ele, como uma galinha). Para tornar as cenas mais intensas, o filme faz um uso muito grande da cor vermelha, representativa no sexo e a cor da bandeira japonesa. O nacionalismo passa a se misturar com o sexo selvagem. É como se isso não fosse somente aceito, mas como fizesse parte do país. Essa é a indicativa que essa paixão toda não acontecia somente com esse casal, mas sim num país em constante conflito cultural.

“Sou insaciável e amo sem restrições.”

Chega um momento que tudo passa a fugir do controle. Kichizo não pode mais chegar perto da esposa por causa do ciúme de Sada. A reputação dele (e da casa dele, inclusive) fica manchada. Para não deixá-lo sair de casa, ela tira o kimono do alcance dele. As ameaças de morte (no ciúme) se tornam mais freqüentes. Apesar da desculpa torpe que a medicina deu para o apetite sexual de Sada (ela seria “sensível” ao sexo, tornando-o mais prazeroso ainda), a selvageria chega à fronteira da loucura. Sada era capaz de ver um teor sexual até em crianças. Mas o principal é perceber a passividade de Kichizo. Ele realmente sentia prazer em se sentir dominado, sem saídas. E assim, iniciam o jogo mais perigoso e extremista deles: o prazer pela asfixiação. O tesão pela morte de Sada unida ao prazer de ser dominado por Kichizo formou um conjunto perigoso. E como não podia deixar de ser, terminou em tragédia. Para sentir o prazer máximo e não ficar com a dor depois, Kichizo pede para que Sada o estrangule até ele morrer. Ela, maravilhada por sentir o prazer máximo ao vê-lo morrer, fica tão satisfeita e enlouquecida que, depois de quatro dias, é vista nas ruas (e presa, posteriormente, por homicídio), feliz e segurando o pênis cortado fora de Kichizo. E saber que isso é história real torna tudo mais incrível e assustador. O casal conheceu, viveu e morreu na plenitude máxima que o prazer sexual poderia oferecer.

"Sorte no amor. O amor é cego. Homem cego é bobo. Bobo de amor. O amor é bobo."

domingo, 24 de outubro de 2010

Sherlock Holmes

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Filme estadunidense produzido em 2009, trouxe de volta para as telas a série policial (e cômica) de Sherlock Holmes e Dr. Watson. O último filme dessa série foi feito em 1988 (com o filme Sherlock e Eu). Foi baseado nas histórias de Sir Arthur Conan Doyle (médico) e tudo acontece por volta de 1981, na Londres vitoriana. Mas não voltou como continuação ou refilmagem, mas sim como uma reinvenção da saga de aventuras do detetive particular. Levou o Globo de Ouro de "melhor ator" e foi dirigido por Guy Ritchie.

Sherlock Holmes é o detetive particular espertão e desajeitado, com seus hábitos peculiares. Mestre das artes marciais, domina o baritsu e o boxe. Assim, é capaz de ter a previsão certeira e antecipada dos golpes que irá infringir e receber. A sua sede de curiosidade e espírito científico e tecnológico o torna um inventor (e experimentador - rãs e cachorros que o digam) para a época. E um grande conhecedor de produtos e reações químicas.

John Watson é médico e veterano de guerra, fiel companheiro de Holmes. Forte e ágil, está lá para fazer funcionar o lado racional de Holmes. No filme, há um conflito entre eles, pois Watson vai se casar com a Sra. Mary. Com o casamento a vista, o doutor decide não se aventurar mais nas investigações de Holmes, mas o ciúme gerado um pelo outro causa até certa tensão sexual entre eles. Quer dizer, pelo menos o filme tentou transparecer isso.

Blackwood é o vilão da história, que se mostra completamente oposto a Holmes. Ele se diz detentor da magia negra e causa a morte de diversas pessoas de maneira muito estranhas, como, por exemplo, ser enforcado e ressuscitar, fazer um pegar fogo ao atirar e outro se afogar em sua própria banheira. Filho bastardo de um dos lordes da Câmara de Londres, concebido em um ritual no estilo maçom, resolve se vingar de todos e tomar o poder de Londres, querendo matar a todos da Câmara que não lhe fossem fiéis a ele. A missão de Holmes e do delegado Lestrade é impedir isso. Inclusive, não tem como deixar de perceber o quão a Scottland Yard é mau vista. Ineficiente, atrasada e atrapalhada, acaba por depender quase que completamente de Holmes, apesar de serem bastante orgulhosos e se acharam superiores. Viu só? Caricaturaram a melhor polícia do mundo. Não que tudo seja completamente mentira.

Tão oposto quanto Blackwood é amor da vida de Holmes, Irene Adler. Ladra, a única capaz de enganar Holmes algumas vezes, reaparece trabalhando para o professor Moriarty. Esse professor estava atrás de uma única tecnologia de Blackwood que provavelmente iria mudar o mundo como nunca havia visto antes: o controle remoto. É uma bela homenagem para um objeto que, hoje, é crucial no nosso dia a dia.

Por fim, Holmes e sua turma conseguiram deter Blackwood que acabou por se enforcar e morrer (só que dessa vez de verdade). E Holmes consegue provar aquilo que sua mente sempre te disse: não há magia (nem negra, nem branca). Eram truques de mágica que ganharam credibilidade com o medo gerado pela superstição e a reputação de Blackwood. Esses truques incluíam uso de ervas, reações químicas, medicina antiga e moderna, etc.

Agora, o maior personagem do filme não é Holmes ou alguém da sua turma, mas sim a cidade Londres. Toda sua geografia faz parte dos filmes e a construção da Ponte de Londres, moderníssima para sua época, mostram todo o esplendor de uma Londres Vitoriana sob o signo do progresso industrial. Muito show.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O que terá acontecido a Baby Jane?

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

What ever happened to baby Jane?

Filme estadunidense de 1962 baseado no livro homônimo de Henry Farrell. Levou o Oscar de “melhor figurino” e foi perceptivelmente influenciado por filmes como Psicose e Crepúsculo dos Deuses ao usar o preto-e-branco opcional e retratar a decadência e isolamento de grandes estrelas do cinema. Apesar da falta de confiança no filme, o show de atuação das atrizes Joan Crawford e Bette Davis fez do filme um verdadeiro sucesso.

1917

Jane Hudson (Bette Davis) brilha nos palcos de teatro com seu pai, apesar da pouca idade. Mimada e grosseira, tem noção do sucesso que faz e do dinheiro que traz pra casa, o que a torna mimada e teimosa. Blanche Hudson (Joan Crawford) sua irmã igualmente criança, sofre com a falta de atenção dos pais e com as “mimadices” de sua irmã. E promete que se lembrará disso no futuro.

1935

Agora é o contrario. Blanche é a estrela do cinema, já havia se firmado como a rainha das telas e era um sucesso estrondoso. Jane entre em decadência por sua péssima atuação diante as câmeras e começa a beber sem parar. Ela era uma atriz de teatro infantil, isso não indicaria que seria uma boa atriz de cinema, mostrando também a importância dos filmes diante as peças de teatro. O teatro estava no passado, assim como Jane. O prelúdio do que estar por vir é quando a Blanche decide comprar a antiga mansão do Valentino. Ele era uma antiga e muito famosa estrela do cinema mudo, que não conseguiu se adaptar ao novo cinema que estava por vir. Mal sabia que ela entraria no mesmo esquema. Blanche também era conhecida por sua simpatia e bondade com a irmã que estava com a carreira em queda. Até o dia do acidente de carro que a deixou paraplégica e minou para sempre a carreira das duas (Jane havia fugido do local no momento e foi sumariamente culpada por tudo).

1963

As irmãs Hudson, já em idade avançadas, se encontram completamente solitárias, isoladas dentro da antiga mansão Valentino. Blanche, em sua cadeira de rodas, permanece sempre presa em seu quarto no segundo andar por sua condição. Jane, mais beberrona e visivelmente frustrada e rancorosa por ver que a carreira de sua irmã é repetidamente lembrada, se mostra cada vez mais enlouquecida pelo esquecimento e envelhecimento.

Ao saber que Blanche quer vender a casa (que Jane diz ter sido comprada com seu próprio dinheiro ganho na infância) e colocá-la num “lugar que cuidem bem dela” (literalmente um hospício), passa a enlouquecer de vez. Tira os telefones do alcance das mãos de Blanche, dá um pássaro morto e depois um rato para ela comer, joga as flores e cartas de fãs fora e passa a imitar a voz de Blanche nos telefones e também as assinaturas dela nos cheques. Apesar de Blanche ter piedade da irmã sempre, percebe que tudo está passando dos limites e decide agir logo, mas já era tarde demais. Todos seus meios de comunicação foram cortados, a condição física não ajudava e sua única pessoa que mantinha contato além da irmã era a empregada Elvira, que havia sido morta pela mesma. A Elvira é o foco da bondade de Blanche e do desprezo de Jane, iria morar junto com ela quando Jane fosse pro hospício. Era o símbolo da liberdade de Blanche. E, ao descobrir Blanche amordaçada e amarrada na cama por Jane, é morta com uma martelada na cabeça. É depois disso que vemos a total loucura de Jane, quando ela diz que foi obrigada a matar a Elvira e culpa até mesmo Blanche por isso. Ao perceber que a irmã deve morrer, Jane então decide arranjar dinheiro à sua própria maneira. E a idéia dela foi simples e, para ela, com certeza daria certo: voltaria a cantar a sua música de sucesso quando era a Baby Jane.

“Eu escrevi uma carta para o papai.”

Depois de colocar um anúncio no jornal e Edwin, um pianista desempregado, aparecer em sua casa para tocar a sua música, a loucura de Jane enfim se torna “pública”. O que antes somente sua irmã vira, agora uma pessoa de fora também poderia ver. Jane canta e dança como se ainda tivesse seis anos. Seu comportamento e felicidade são praxe de crianças de seis anos. Mas seu corpo e sua voz não. Esses ela não têm como enganar. Apesar de ter percebido no começo, seu estado de loucura atingiu um limite tal que nem de frente pro espelho ela percebia que o tempo havia passado e que, em Jane, não havia nenhum Baby. Mas nem tudo era culpa dela. Ninguém foi capaz de dizer na cara dela que ela não era mais lembrada e que havia envelhecido. Por motivos diferentes (educação, dinheiro, pena, etc.) todos permaneceram calados e Jane interpretou o silêncio erroneamente, como se fosse positivo para ela.

“Você não era feia. Eu a fiz assim.”

Tudo começou a cair por terra quando Edwin, que já sabia do passado das irmãs Hudson e que continuava a ir à mansão somente pelo dinheiro, descobre Blanche amordaçada e quase morta. Em vez de ajudá-la, sai correndo desesperado e posteriormente chama a polícia. Jane então leva as duas para a praia, lugar de tantas lembranças do passado dela com pai, quando treinavam juntos para ela ser a Baby Jane. Lá, Blanche entra naquele assunto que ela sempre quis evitar: o acidente de carro. Blanche admite, enfim, que não foi Jane que tentou atropelá-la, mas sim o contrário. Blanche tentou passar por cima de Jane. Estava com raiva por ter sido tão mal-tratada por tanto tempo. E assim se esvai o último fio de sanidade de Jane. Depois da notícia, a única coisa que ela resolver fazer é buscar um sorvete, regressando de uma vez por toda ao seu estado infantil. O sumiço das duas, tão noticiado nos jornais, fez com que a polícia fosse alertada e acabaram por a encontrarem na sorveteria. Quando os policiais a cercou e uma multidão se formou em volta, ela fez aquilo que ela achava que tinha nascido para fazer durante toda sua vida: cantar e dançar. Afinal, para ela, a multidão estava lá para ver isso. A loucura havia lhe dado o perdão. Ela nunca veria o quão fundo havia chegado. Pelo menos os policiais encontram sua irmã na areia e a salva. Ou não.

“Então poderíamos ter sido amigas o tempo todo?”

domingo, 17 de outubro de 2010

Nine

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Filme estadunidense lançado em 2009 e baseado na peça homônima da Broadway (ganhadora de vários Tony). Essa peça foi baseada no famoso filme "Oito e Meio" de Federico Fellini. O título desse filme (8 e 1/2) estaria ligado ao número de filmes dirigidos por Fellini. Então, fica óbvio de onde vem o título do filme, dessa vez dirigido por Rob Marshall, Nine (9). Apesar de 10 indicações ao todo no Oscar, Globo de Ouro e BAFTA, não levou nenhum dos prêmios. O filme chama atenção pela mistura da fala americana, italiana e francesa nas canções e pela quantidade de protagonistas conhecidos mundialmente (são seis ganhadores de Oscar, uma vencedora do Globo de Ouro e uma ganhadora do Grammy). Temos, como ator principal, Daniel Day-Levis e também as magníficas Sofia Loren, Nicole Kidman, Fergie, Judi Dench, Kate Hudson, Marion Cottilard e Penélope Cruz.

"Você mata o seu filme várias vezes. Sobretudo ao falar dele."

É bom, antes de falar sobre o filme, que o objetivo não é imitar o Fellini 8 1/2, mas sim o espetáculo teatral que veio posteriormente. A metalinguagem do filme acontece no cineasta sem a menor inspiração para criar um filme enquanto suas próprias lembranças acabam por formar um filme. Todas essas lembranças o impediam, de certa forma, de criar um filme chamado “Itália”, até entender que a Itália dele era exatamente essas lembranças. E quem melhor para formar essas lembranças do que as mulheres de sua vida?

“Me pergunto, do que vale algo bom senão em excesso?”

Aclamado como um dos principais cineastas da Itália, Guido Contini (Daniel Day-Levis) entra numa crise onde não entende seus desejos. Conseguiu tudo que queria, mas queria mais. Ele queria tudo. Apesar de já o ter. Sem conseguir admitir seu “fracasso” em criar um filme, ele foge para o Spa Bellavista Hotel para se isolar de tudo e de todos. A tentativa foi frustrada, pois seu produtor o encontrou e levou toda sua equipe para o Spa. Talvez sua frustração se encontre na velhice. Ter a noção que um dia poderá morrer pode assustar a qualquer um.

“Quem tem medo de beijar seus pés? Eu não!”

A belíssima Carla (Penélope Cruz) é a amante que Guido carrega desde muito tempo. Ela é loucamente apaixonada por ele e pelo sexo que tem com ele. E é com ela que Guido realiza muitas de suas fantasias sexuais. Apesar de chamá-la pra ficar no Spa, ele a coloca numa pensão velha e barata. É como se ele não a quisesse perto, mas não conseguisse ficar sem ela. Ela percebe esse distanciamento e se sente rejeitada. Num determinado momento, ela tenta (e fracassa) o suicídio. Assim, Guido entende o mal que fazia para ela, e a entrega de volta para o marido dela, Luigi. É como se ele encerrasse mais um capítulo de sua vida.

“Le cinema hoje está em crise. Os diretores são tão existencialistas.”

Lilli (Judi Dench) é a figurinista de Guido. Parisiense, foi dançarina na época dos exuberantes Folies Bergerés. Adora a música, a dança, a cor e os exageros. Foi ela quem moldou o Guido cineasta. Moldou tanto que ela passa a conhecê-lo mais do que ele mesmo, muitas vezes prevendo suas ações e erros. É a ela que ele deve todo seu conhecimento e paixão pelo cinema (e pelas mulheres). Independente do que aconteça, ela sempre estará ao lado dele. E ele sempre voltará pros braços dela. E é ela que tenta salvar seu filme e o casamento. Infelizmente isso não dependia somente dela.

“Sua imaginação não teve uma educação moral.”

Perdido, Guido inicia uma busca espiritual ao saber que o cardeal do Vaticano se encontrava no Spa. Há uma eterna contradição na Igreja Católica, muito bem definida no filme ao mostrar a adoração pessoal pelos filmes de Guido enquanto publicamente condena-os. Apesar de não ser católico nas ações, acredita no Deus cristão. Ao ouvir as repostas a seus conselhos, percebe que não era isso que estava procurando. E acaba lembrando-se das mais velhas recordações. Dos tempos de infância, enquanto estudava em um internato religioso.

“Seja italiano. Seja cantor. Seja conquistador.”

A primeira experiência de Guido aconteceu enquanto ele estava nesse internato. Ele e seus colegas juntaram dinheiro suficiente para pagar Saraghina (Fergie), uma prostituta grosseirona, rústica e pobretona que mora num Bunker abandonado após a II Guerra Mundial. Ela lhe apresentou o mundo das mulheres e os prazeres da carne, mesmo que só visualmente. Depois dela cairiam muitas amantes belas e passageiras nas mãos de Guido. Mesmo ele sendo castigado pelos padres que encontraram os meninos no meio da dança erótica de Saraghina.

“Você quer minha alma? Bom proveito.”

Luiza Contini (Marion Cottilard) é a personificação da perfeita esposa católica. Deixou de atuar (famosa na época) para se casar com ele, sendo completamente devota. É o símbolo do sacrifício pelo casamento. Sacrifício esse que não se mostra valido. Sentindo-se rejeitada e sabendo de suas traições (principalmente com Carla), derrubou o casamento ao perceber que Guido já tinha outra esposa: os filmes. O trabalho era muito mais importante que a esposa. As mulheres estão apenas na beirada dos filmes. Tudo é feito em prol dos desejos que ele possui. E ela não aguenta mais essa situação. Depois de se separar dele (mesmo com ele não querendo o término do casamento, pois a ama de verdade), ela volta a atuar e fazer sucesso. Também arranja um novo relacionamento, e se torna uma pessoa feliz.

“A vida é real como no cinema italiano.”

O que melhor do que uma jovem e sexy jornalista americana morrendo de amores por seu ídolo? Guido não podia deixar Stephanie (Kate Hudson) passar pela sua vida sem se deitar com ela. A paixão que ela tinha pelo seu trabalho era um elogio que ele precisava. E um afrodisíaco também. Mas no último instante ele percebeu que iria ser mais um caso conturbado em sua vida. E que ele já havia encerrado esse momento da sua vida (após terminar com Carla). Ele não podia se enrolar nisso novamente.

“Você acha que muitas te amarão como eu?”

O fantasma da mãe de Guido (Sofia Loren) o perseguia. O saudosismo que tem pela mãe está ligado diretamente à proteção que ela lhe dava. Ela guiava seus passos. Mesmo depois de morta.

Assim, Guido volta à Roma. E volta para os estúdios. Lá encontra a última inesquecível mulher de sua vida.

“Ela é a inspiração dele.”

Cláudia Jenssen (Nicole Kidman) é a musa e a protagonista dos filmes de Guido. Ela é a representação da mulher por detrás de todos os homens e é apaixonada por Guido. Mas ela se mostrou a mais realista de todas. Sabia que ele não era capaz de amá-la. Que ele amava a mulher que estava atrás das lentes das câmeras, não a mulher da vida real. E que ela não poderia fazer nada para mudar isso. E por isso, ela desiste dele. Ela quer a vida real, não a vida das telas de cinema.

“Se deixar de ser criança não fará mais filmes.”

Então ele se vê completamente abandonado por todas suas mulheres e desiste de fazer o filme Itália, tirando um tempo para recuperar. Após de provar o anonimato (e curti-lo), finalmente ele entende qual o filme da vida dele. O filme é as mulheres da vida dele. Sem elas, ele não seria nada. E sem ele, elas não seriam um filme. Elas não seriam história. Ele começa a entender a sua vida. E a recomeçá-la. Então o tema de sua vida (e do filme) é exatamente aquilo que ele nunca conseguiu lidar: as mulheres.

“Ação!”



quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Bastardos Inglórios


Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Inglorious Basterds

Filme estadunidense lançado em 2009. Christopher Waltz, pelo seu papel como ator coadjuvante, levou todos os prêmios que o filme ganhou: Oscar, BAFTA, Globo de Ouro, Festival de Cannes e Screen Actors Build. Foi dirigido por Quentin Tarantino que considera o filme sua obra-prima épica. Toda a história se passa na França em plena II Guerra Mundial, invadida pelos alemães.

“Nazistas não têm humanidade.”

Misturando o fictício com realidade, o filme mostra duas histórias paralelas que tem por fim o mesmo objetivo: acabar com o Nazismo. A primeira é a história de Shosanna, uma judia que tem toda sua família morta pelo coronel Hanz Landa da SS (atuado magistralmente por Waltz), mas que consegue fugir para Paris e assim construir sua vida. A outra é a história do grupo Bastardos Inglórios (que existiu na realidade). Eles tinham como o único objetivo matar o maior número possível de nazistas.

“Au revoir, Shosanna.”

Em 1944, três anos depois de o coronel psicopata Hanz Landa matar sua família, Shosanna foi adotada pela família Mimieux e ganha um novo nome: Emmanuelle. Depois que sua família adotiva morreu, Emmanuelle passou a cuidar do negócio da família, um pequeno cinema chamado Le Gamaar, com um negro, que também era seu amante (apesar de seu relacionamento não ser público por causa do preconceito nazista). É nesse cinema (uma clara metalinguagem do filme) que tudo irá acontecer. Um dia, conheceu Fredik Zoller, um soldado nazista condecorado por matar 300 judeus do alto de um campanário. Ele chegou a se tornar ator do filme em que ele representa sua própria façanha e se apaixona pela jovem Mimieux. Assim, ela foi catapultada para a alta sociedade alemã a tal ponto que Goebels decidiu passar o tal filme de Fredik em seu cinema. Lá estaria presente a nata da sociedade nazista: Hitler, Goebels, Goring e Bormann. E assim, Emmanuelle aceitando a tudo passivamente, arquiteta sua vingança suicida. Inclusive, essa aceitação forçosamente passiva de Mimieux mostra a verdade histórica na falta de respeito dos nazistas pela França e pelos franceses. Cá entre nós, esse foi um dos momentos mais humilhantes da França, ao abrir o majestoso Palácio de Versalhes para o bel prazer de Hitler e levarem algumas obras importantes do Museu do Louvre para enfeitarem suas próprias casas.

“Eu quero meus escalpos.”

Os Bastardos Inglórios era um grupo com oito soldados liderados por Aldo Raine. Eles tinham como o objetivo mínimo matar 100 nazistas e levar seus escalpos a Aldo. O objetivo maior era matar a todos que encontrassem pelo caminho. Aqueles que eles deixavam viver eram marcados a faca com o símbolo da suástica na testa. Não menos cruéis que o coronel Landa, faziam parte do grupo Hugo Stiglitz e o Urso judeu. Stiglitz é um psicopata alemão que traiu o próprio exército ao matar treze oficiais da Gestapo. Já Donny, que leva o apelido de Urso Judeu, tem a fama de matar nazistas com porradas de bastão. Ao descobrirem o encontro dos nazistas no cinema Le Gamaar, eles decidem arquitetar um plano com a espiã da Inglaterra Bridget Von Hammersmark, uma famosa atriz alemã.

“Eu bato em você e você bate no chão.”

Emmanuelle junta o maior número de rolos de filmes possíveis (350) de madame Mimieux e coloca atrás da tela do cinema. Os rolos de 35 mm eram tão explosivos (por causa do nitrato) que eram proibidos de serem transportados em bondes. Ela irá trancar as portas de entrada do cinema e colocar fogo com todos dentro da sala de exibição. Paralelamente, os Bastardos Inglórios se encontram com Bridget num bar que fica num porão (falta de estratégia completa por parte da atriz) e lotada de nazistas (falta de sorte, um deles acabou de ter filho e foram liberados do exercito durante o dia). Mas o maior problema foi o cineasta contratado pelos ingleses para explicar a Operação Kino. O cineasta não tinha sotaque alemão, apesar de se passar por um. O porão se transforma numa verdadeira batalha e quase todos que estão lá morre (só Bridget vive). Aldo Raine e Donny (que não haviam participado da conversa) a tiram de lá e cometem mais um erro: esquecem o sapato dela lá. Ou seja, esse momento foi o maior fracasso dos mocinhos no filme. E quem poderia mais se apoderar desse erro? O coronel Hanz Landa, é claro.

“Eu sei o que o ser humano é capaz de fazer quando abandona a dignidade.”

No dia da exibição cinematográfica, quatro dos Bastardos Inglórios entram com Bridget no cinema. Hanz os recebe, leva a atriz para uma sala privativa e testa o sapatinho nela. Diferente do desenho da Disney, o “príncipe” pula no pescoço de Von Hammersmark e a mata. Depois, pega dois dos Bastardos Inglórios (Aldo e o Urso), os prende e os levam para um restaurante vazio (os outros dois já haviam entrado). Assim, negocia com Aldo e o chefe de operações inglesas (por telefone) em conseguir uma vida nos EUA em troca de deixar “tudo rolar” no cinema. E ele consegue. Não antes de Aldo marcá-lo na testa. Assim, ele jamais deixará de ser um nazista reconhecido por todo o mundo. No cinema, Emmanuelle libera o comando para o negro atear fogo no cinema, mas mata Fredik e é morta por ele antes que ele morresse. O filme, chamado “Orgulho da Nação” para de ser passado por um momento e aparece ela declarando todo seu ódio e desprezo. Quando todos se dão conta do que está realmente acontecendo já é tarde demais: as portas estão trancadas. E tudo pega fogo. Os dois Bastardos Inglórios conseguiram entrar no camarote de Hitler (visivelmente retratado como um louco) e acertam muitos tiros em seu rosto, ativando as bombas presas aos seus pés em seguida. O cinema inteiro explode e ninguém sai vivo de lá. A vingança de Tarantino foi conquistada. E todos morreram antes de fazer maior mal. Pena que foi apenas um filme.