sábado, 21 de agosto de 2010

Ladrões de Bicicleta

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Ladri di Biciclette


Filme italiano dirigido por Vittorio de Sicca em 1948. Feito na Itália recém saída da II Guerra Mundial, toda a agonia da população de uma pátria derrotada é mostrada nesse filme, que foi um marco no cinema neo-realista italiano. Levou o Oscar de “melhor filme estrangeiro” e é feito com o uso de atores amadores.

Com uma tremenda crítica social, de Sicca mostra a história de Antonio Ricci, um pobre operário que às muitas custas consegue um emprego em meio a um mar de outros desempregados. Ele teria que colar pôsteres (que muito interessantemente, o filme mostra Ricci colando o cartaz de Gilda, um dos filmes mais queridos dos Estados Unidos) e para se locomover, precisaria de uma bicicleta (sem a mesma, perderia o emprego). Depois de vender seus próprios lençóis, consegue reaver a sua, que estava penhorada. É curioso perceber a força do dinheiro na família dele. Antes, o casamento parecia ser puramente aparências, mas depois de ter arranjado o emprego, o brilho da esperança reacendeu o amor entre Ricci e sua mulher.

O diretor brinca, durante todo o filme, com um suspense criado pelo título. Assim, faz toda hora o espectador achar que a bicicleta será roubada (até que uma hora isso realmente acontece). Durante o filme, outras relações de Ricci passam a ser mostradas durante a busca dele pela bicicleta roubada.

Uma relação bem curiosa é entre a esposa de Ricci com Santona, uma vidente conselheira. É visível a quantidade de pessoas que a visitam em busca de esperanças e bons conselhos. Mais visível ainda é a fé que as pessoas colocam nas palavras de Santona. O irônico é que Ricci, que zombou e desacreditou no começo, após o fracasso na busca da bicicleta, vai atrás dos conselhos dela (passando a frente de todos, se mostrando como o mais desesperado do local).

Ricci é um cara com bons amigos, que ajudam a ele procurar a bicicleta, mas que depois de um dia procurando, voltam a fazer suas coisas. Então, por mais que ele tenha amigos, não adianta, eles não serão a sua salvação. E nem a polícia. A primeira coisa que Ricci faz é ir prestar depoimento na polícia e implorar pela ajuda deles. Mas é como um dos policiais disse: “é só uma bicicleta”. E não fizeram absolutamente nada. Nem quando ele encontra o ladrão na rua as pessoas param para ajudá-lo ou aparece um policial para deter o bandido. Na verdade, essas pessoas só apareceram em momentos que todos se mostravam contra Ricci. Era ele contra o mundo o tempo inteiro.

Vemos também a missão, que ajuda as pessoas pobres a se barbear, comer e ouvir a missa. Apesar dessa ajuda toda, não passa de superficialidade. A solução da vida não está naquele local. O máximo que eles podem fazer é te ajudar a sobreviver mais um dia. E dar esperança através da religião.

Talvez a relação mais importante do filme seja entre Antonio Ricci e seu pequeno filho Bruno. Acompanhando o pai desde o começo, Bruno se mostra como o personagem mais esperto, seguro e preparado, apesar da pouca idade. Estava consciente o tempo todo que havia pouco dinheiro e mesmo esfomeado, ficou ao lado do pai, sem roubar ou fugir em nenhum momento. Mas, mesmo assim, é apenas uma criança. Não resistiu em competir o poder com uma criança rica do restaurante que ele parou para comer e se enfureceu quando seu pai lhe esbofeteou sem um motivo aparente. Mas até mesmo quando o pai é pego roubando em flagrante, mesmo decepcionado com toda a desventura errônea que o pai faz, o amor que nutria pelo mesmo se mostrou mais forte e inabalável.

Mas o principal do filme pode ser visto também na ética aplicada por Ricci em toda sua desventura. Num meio em que o valor da profissão sai do sujeito (Ricci) e vai para o objeto (bicicleta), se dá bem aquele que for mais malandro. Para tentar conseguir a bicicleta de volta, acusou pessoas injustamente, ameaçou um idoso dentro de uma igreja, brigou com um garoto no meio da rua até que o mesmo começasse a ter convulsões e caísse no chão, atrapalha o trabalho de pessoas, invade casas e, por fim, depois de ter fracassado, rouba uma bicicleta. A única coisa que o tornou diferente é que, dessa vez, um ladrão de bicicleta foi pego. E ele foi o tal. Mas mesmo assim, não deram queixa nele. Afinal, era mais um pobre. Tudo foi instinto de sobrevivência. Aquele que Ricci não perdoava no começo era o qual ele tinha se transformado. Toda sua honra e orgulho havia se desvalido. Era apenas mais um coitado.


obs: O filme não faz parte da coleção, mas foi objeto de estudo na faculdade e muito apreciado. Portanto, a resenha foi feita com a mesma atenção que meus próprios filmes.

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