domingo, 25 de abril de 2010

O Enigma de Kaspar Hauser e sua análise de acordo com Stuart Hall

Atenção: O filme é comentado do início ao fim, podendo conter spolier.

Jeder für sich und Gott gegen alle (título original do filme)
O filme foi lançado em 1974 pela Alemanha Ocidental e tem como diretor o célebre Werner Herzog. A história é verídica, mas até hoje os motivos do assassinato são um mistério. O título original é “Jeder für sich und Gott gegen alle” e significa “Cada um por si e Deus contra todos”. E é a partir da idéia desse título que o filme se desenrola.

Kaspar Hauser era um menino de 15 anos que, em 1828, fora encontrado em uma praça de Nuremberg. Ele havia sido submetido ao confinamento por toda a sua vida e nunca teria tido algum contato com nenhum ser humano (seu alimento era colocado através da porta enquanto dormia). Por causa desse confinamento a que foi submetido durante toda sua vida, Hauser ignorava qualquer idéia de lar, educação, ciência e religião (as quais a sociedade considera, no mínimo, importantes para a sua própria sobrevivência). Depois de 4 anos, sob os cuidados de um professor interessado na sua formação, foi assassinado no jardim de sua casa.

Stuart Hall é o escritor do livro “A identidade cultural na pós-modernidade”. No livro, Hall faz a análise da crise que estaria acontecendo com a identidade cultural, focalizando no sujeito, na sociedade e na nação e o processo de globalização. No mesmo, é mostrado as três concepções de identidade do sujeito: do iluminismo; do sociológico e do pós-moderno. Ao desenrolar do livro, é perceptível certas ligações entre o livro e o filme de Kaspar Hause.

Das três concepções de Hall, Hauser se encaixa no sujeito do iluminismo. Ao crescer isolado da sociedade, não foram dirigidas a ele valores, sentidos e símbolos, o distanciando daquilo que chamamos de cultura, ou seja, seu eu real não é formado e modificado por elementos exteriores, então ele não poderia ser um sujeito sociológico. Por não participar do processo de formação do sujeito soiológico, ele não possui identidades contraditórias, como diz o sujeito pós moderno. Por fim, sua personalidade se torna individualista, centrada e unificada, fazendo o uso do núcleo interior durante seu desenvolvimento. Isso dura até no momento que ele entra em contato com a sociedade, que tenta modificá-lo de todas as formas possíveis.

Seja com a religião tentando fazê-lo crer em Deus, a ciência fazer testes de lógica que não serviam para ele e a nobreza usá-lo como uma peça excêntrica e única, nada se encaixou com a personalidade dele, tornando-o um ser completamente deslocado, enxendo-o de tristezas que lhe faziam rever cada vez mais seus conceitos criados por toda uma vida sozinho.

Na sociedade moderna, é criada a figura do indivíduo isolado, exilado ou alienado em meio a uma multidão de pessoas. Essa figura se encaixa perfeitamente em Kaspar Hauser. Por mais que ele seja localizado e definido na sociedade moderna (seja como uma peça excêntrica, cobaia ou mais um cordeiro de Deus), isso não o integrou à sociedade, mesmo com toda a sua segurança e auto confiança. Isso reverteu o ciclo factual, que mostra o indivíduo com seu interior fragmentado enquando a sociedade se integra cada vez mais, por seus diferentes elementos e identidades que podem serem conjuntamente articulados. Hauser não tinha seu interior fragmentado (apenas pertubado por não entender o funcionamento de uma sociedade) e não se integrou a sociedade.

Hauser, apesar de tirar grande proveito da globalização, que são os processos de mudanças que atravessam suas fronteiras (ao sair do calabouço e se encontrar com o mundo de novidades), ele não criou uma identidade de cultura nacional, até por nunca ter tido uma antes. Como poderia ele se enxergar como parte de algo maior (como nós, que nos sentimos parte de um povo e uma nação) se ele nunca o teve? Para ele, a única coisa que importava era aquilo que ele dizia ao ser encontrado em Nuremberg:

“Quero ser um cavaleiro como o meu pai.”

ps: Esse filme e a análise através o livro de Stuart Hall foram partes de um trabalho feito para a minha faculdade de jornalismo. Não o tenho na minha coleção, mas ele foi tratado com a mesma atenção que os outros.

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